um manifesto

Giovanna Caleiro
2 min readJan 30, 2022

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“eu quero sair da defensiva”, foi o que eu te falei, quase pedindo.
eu quero chegar em todos os lugares e encontros de peito aberto, desarmada, sem colete à prova de balas.
confiar cegamente.
acreditar que ninguém vai me machucar, ainda que todo mundo possa.
entregar meu coração de bandeja no primeiro dia.
não viver acuada.
deixar meu orgulho e meu medo de bicho ferido guardados tão fundo que não emergem nunca.
acreditar que você não tem motivo pra me machucar e então não precisar ter medo nunca.

eu não quero sentir medo nunca mais.

quero viver sem medo de que alguém esbarre no lugar que outra pessoa machucou.
não culpar ninguém por uma ferida que foi sem querer.
não ter medo de dor nenhuma.
botar a mão no fogo por você e por todo mundo.
destruir a armadilha capitalista-patriarcal-neoliberal de que não se pode confiar em ninguém.
eu quero confiar em todo mundo de primeira.
perdoar todo mundo que se arrependeu de verdade.
dar uma, duas, trinta chances.
eu quero continuar confiando como eu-criança confiava em qualquer adulto.

confiar no seu julgamento, na sua autonomia. confiar que você nunca vai me culpar por nada que eu não tenha feito.
confiar que você nunca vai me machucar de propósito.
confiar que você vai saber lidar com o que é seu.
e confiar em mim.
confiar que eu não vou te machucar nunca, não por querer.
e que eu vou saber elaborar a minha angústia sem te culpar.
e que eu nunca vou esperar que você aja como outra pessoa já agiu comigo. pro bem ou pro mal.
confiar no nosso ineditismo, na nossa capacidade de regeneração.
esperar muito da gente.
confiar que a gente dá conta e acolher os tombos de quando a gente não dá.

sair da defensiva, trancar a porta, jogar a chave fora.
não me defender nunca mais.

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Giovanna Caleiro

Dedicated to everyone who wonders if I’m writing about them. I am.